ENCONTRO DIOCESANO DE MINISTROS
EXTRAORDINÁRIOS DA SAGRADA COMUNHÃO
“A TEOLOGIA E A
MÍSTICA DA CARTA APOSTÓLICA PORTA FIDEI” (texto a ser corrigido).
Pe. Joaquim Cavalcante
O Ano da Fé iniciou em 11 de Outubro
de 2012 e vai até a festa de Cristo Rei, em 2013. Na verdade, cada ano na vida
da Igreja poderia ser descrito e chamado de Ano da Fé. Então o que tem de
especial em um Ano da Fé?
Antes de tudo, não é a primeira vez
que a Igreja proclama um Ano da Fé.
Em 1967, Paulo VI proclamou um Ano da Fé para comemorar o 19º Aniversário dos
Santos Apóstolos Pedro e Paulo.
O Papa Bento XVI compreendeu o Ano da
Fé como um momento solene para toda a Igreja fazer uma autêntica e sincera
profissão de Fé, como os grandes apóstolos Pedro e Paulo.
Este é um ano especial. No coração
deste ano de graça é que cada fiel, cada batizado: individual e coletivamente,
faz livre e conscientemente a autêntica profissão de fé.
Portanto, toda a Igreja espera que
nós, fazendo nossa renovada profissão de fé, sejamos revigorados, purificados e
confirmados na fé e que confessemos nossa fé com maior confiança, liberdade e
convicção.
Este Ano da Fé é singular. Ele se dá
no contexto do 20º Aniversário do CIC, o 50ºAniversário da abertura do Concílio
Vaticano II e, em outubro, os Bispos do mundo estarão reunidos para refletir
sobre “a nova evangelização e a
transmissão da fé cristã”.
Tudo contribuirá para que nós sejamos
confirmados na fé apostólica sistematizada no dogma, pensada pela teologia e
celebrada na liturgia. Esta é a fé da Igreja. A fé ilumina a razão e a razão
explicita e ajuda a compreender a fé. Desse modo, entendemos que uma não se
opõe à outra.
O Ano da Fé interpela muitos aspectos
da nossa fé pessoal e comunitária ou eclesial. O CIC nos ensina dizer eu creio e nós cremos. Dizer eu creio é expressar minha “adesão pessoal e meu
consentimento livre a toda verdade que Deus revelou” (CIC,150). A fé é um ato
pessoal: é a resposta livre do homem à iniciativa de Deus que se revela (CIC,
166).
E o que significa dizer nós cremos?
Significa que a fé não é um ato isolado (o fato de ser um ato pessoal não quer
dizer isolado). O Catecismo ensina que “ninguém pode viver sozinho, ninguém deu
a fé a si mesmo, como ninguém deu a vida a si mesmo” (CIC, 166). A fé é dom de
Deus, dom recebido mediante a pregação e o testemunho de outros. Se recebermos
a fé de outros, devemos transmiti-la a outros.
Dizer eu creio é a forma da adesão do
ato batismal. Dizer nós cremos é a forma confessada pelos bispos reunidos em
Concílio ambas as formas expressam a fé da Igreja que na liturgia responde a
Deus com sua fé e nos ensina a dizer: eu
creio, nós cremos (CIC , 167).
Penso que o aspecto mais fortemente
interpelador é o do serviço e o da gratuidade. Santo Agostinho nos ensina que o
verdadeiro servo de Deus, “gosta mais de ouvir do que falar” (in ontologia
Litúrgica, 3332). Eu direi que a pessoa que assume uma função na sua comunidade
de fé, ela deve se sentir melhor e mais feliz servindo do que sendo servida. O Ano da Fé é um apelo fortíssimo à autêntica
conversão ao Serviço.
Naquela noite em que Jesus instituiu a
Eucaristia, antes de dar o pão e o vinho aos seus discípulos, ele lavou os pés
de cada um deles. Mas para que Jesus lavou os pés dos doze? Para dar-lhes uma
lição não com palavras, um ensinamento não com discurso verbal, mas com uma
atitude, um gesto concreto e incontestável.
Pedro reage dizendo: “Jamais me
lavarás os pés” (Jo 13, 6). Jesus é bem claro e contundente: se eu não lavar os
teus pés, tu não terás parte comigo. Isto é, se tu não me permites lavar os
teus pés significa que tu não estás disposto a servir os outros.
Meus irmãos, quem não assume o ministério na ótica e na
mística do serviço, jamais se santificará por meio dele. Não nos esqueçamos
de que o nosso serviço, o nosso ministério é fonte de santificação para cada um
de nós.
E quando o ministério deixa de ser
fonte de santificação? Quando nós nos servimos do nosso ministério para nos
beneficiar perante a sociedade, quando fazemos dele uma fonte de proveito
próprio.
Por exemplo, Judas Iscariotes se
serviu do convívio intimo com o Senhor para ganhar 30 moedas. Isso é
vergonhoso, mas aconteceu. Até quando os escolhidos e escolhidas do Senhor vão continuar perto
dele para se beneficiarem? Quando nosso ministério não é movido pela gratuidade
da fé, ele é reduzido a uma mera vantagem pessoal.
Alguns contabilizam quantas comunhões
recebem por mês e quantas vezes tocou o corpo de Cristo enquanto distribuem a comunhão, mas eu pergunto: quantas vezes
você toca o corpo de Cristo na pessoa daquele doente, seja ele homem ou mulher,
criança ou idoso, em casa ou no hospital?
Para ser mais preciso: quantos doentes,
você atende ou visita por mês? Visitar os doentes é uma forma não de lavar
os pés, mas de banhar as pessoas com o amor de Deus.
O gesto do lava-pés é um sinal que
evoca serviço amoroso. Sendo Senhor e mestre, Jesus assumiu naquela ceia, a
verdadeira atitude de servo, de escravo, mas por amor.
A
Teologia e a Mística da Carta Porta Fidei
Entendo que a teologia da Porta Fidei é a teologia do chamado e sua mística é a do seguimento pela vivência da fé testemunhada no
dia-a-dia.
1
– O Chamado
Somos chamados, antes de tudo, para
testemunharmos o amor de Deus, o qual enche nosso coração e nos impele para o
anúncio e a vivência do que anunciamos. O Senhor nos ama e derramou seu amor em
nossos corações.
Assim, ele nos chama para nos
lançarmos no confronto com o mundo para partilharmos nossa fé, proclamar e
testemunhar o seu Evangelho até os confins da Terra. E ele estará conosco
“todos os dias até a consumação dos séculos” (Mt 28,20). A presença do
ressuscitado em nosso meio nos encoraja na luta contra as forças antagônicas à fé.
2
– A mística
A mística da Carta Porta Fidei está centrada na vida em
Cristo que é vivência da fé no seguimento a Jesus Cristo. A Carta nos adverte
contra dois perigos:
a)
O perigo de vivermos
uma fé sem consequências, ou seja, uma fé sem obras.
b)
O perigo de nos
preocuparmos, unicamente, com as
consequências da fé: a militância social, cultural, política e nos esquecermos
da própria fé. Uma coisa não pode ser assumida sem a outra.
É claro que todas essas preocupações expressam a fé,
mas nenhuma dessas dimensões ocupa o lugar da fé. São
consequências da fé, por isso não há fé verdadeiramente autêntica sem essas
dimensões.
Mas, onde a fé se alimenta para dar frutos e para ser
verdadeira e operante? O lugar, por
excelência, da alimentação da fé é na liturgia. Na celebração litúrgica, a fé
se fortalece e se capacita para o agir,
porque a liturgia é o cume e
a fonte da vida da Igreja (SC, 10).
A fé que não é alimentada com a oração
pessoal, com a meditação orante da Palavra de Deus e com a celebração dos
sacramentos é como o sal insípido e uma luz colocada debaixo da mesa. (Mt 5,
13-16).
A oração revigora, dá sabor e sustenta
a fé e a qualifica para o testemunho.
O Ano
da Fé é um convite para que aprofundemos a experiência da refontização da
nossa fé.
A fonte primeira e original da nossa não
é um lugar é uma pessoa, é Jesus Cristo. No mistério da sua natureza divina
unida à nossa humanidade, encontramos o real sentido da nossa existência e da
nossa fé. Devemos mergulhar nesse
mistério sem medo de naufragar.
Em seguida temos as fontes que
alimentam e instruem a nossa fé: a Palavra, os sacramentos, os ensinamentos dos
Concílios, os ensinamentos dos Santos Padres, a liturgia, o Catecismo e tudo o
que a Igreja dispõe para a santificação do povo de Deus.
Devemos sentir sempre de novo, e
ininterruptamente, aquela sede que levou a samaritana ao poço de Jacó. Ali,
mais do que água, ela encontrou Jesus que a convida a “crer nele e a beber da
sua fonte, donde jorra água viva” (Jo 4,14).
Que água viva é essa que mata a sede e aumenta
o desejo de possuí-la mais e mais? É Jesus. É o seu Espírito de amor derramado
em nossos corações, ele é a água viva.
Espírito do Cristo ressuscitado desperta, em nós,
o desejo ardente e o gosto de
“alimentarmos da Palavra de Deus transmitida fielmente pela Igreja e o desejo do
pão da vida, oferecidos como sustento de quantos são seus discípulos (Jo 6,
51). (P.F, 3). Afinal, a obra de Deus consiste em crer e abraçar, pela fé,
aquele que o Pai enviou (Jo 6, 29).
Ora, nesse sentido, podemos dizer que
o Ano da Fé foi proclamado para que nós proclamemos pela fé a obra de Deus.
Precisamos criar, urgentemente, um movimento de volta à fonte da fé.
A verdadeira fonte da fé cristã é
Jesus Cristo, o Filho de Deus, nosso salvador.
Estamos vivendo uma das partes mais
belas do Ano Litúrgico: o tempo pascal.
Em virtude do mistério de Cristo,
Senhor da vida e vencedor da morte, nossa existência é plasmada na ressurreição
e centrada no coração do mistério pascal.
O amor de Cristo que nos salvou pela
oferta da sua vida na cruz, faz nossa fé operosa. O apóstolo Paulo nos ensina
que a fé atua pelo amor (Gl 5, 6). Isto é a caridade é a fé em ação. O amor de
Cristo nos impele à vivência da caridade. (2Cor 5, 14).
Se o amor do Senhor levou à oferta da
sua vida por nós, logo, nós que nos configuramos a Cristo pelo Batismo devemos
prolongar a oblação, a oferta de Cristo pela doação da nossa vida, qualquer que
seja nossa condição (leigo ou não).
Portanto, se é Cristo a porta e a
fonte da fé, é por esta porta, ainda que estreita, que
devemos entrar para a comunhão da vida trinitária. Ele é a porta estreita, mas
sempre aberta para nos dá acesso ao coração de Deus.
“é o amor de Cristo que enche os nossos
corações e nos impele a evangelizar” e a oferecer nossa vida no santo serviço
aos irmãos.
A carta Porta Fidei fala que
Cristo continua a enviar-nos pelas estradas do mundo para proclamar seu
Evangelho a todos os povos da Terra. (Mt 28, 19) (PF, 7)
Urge um empenho eclesial mais vigoroso
que ajude a redescobrir a alegria de crer
e reencontrar o entusiasmo de comunicar
a fé.
Um outro elemento pertinente da mística da carta Porta Fidei é o compromisso.
Esta palavra é banida do vocabulário
do secularismo contemporâneo.
A Porta
Fidei diz que “a fé cresce quando é vivida como experiência de um amor
recebido e é comunicado como experiência de graça e alegria”.
A fé torna-nos fecundos porque alarga
o coração com a esperança e permite oferecer um testemunho capaz de gerar
discípulos. A fé abre o coração dos ouvintes para acolher o convite do Senhor a
aderir à sua Palavra. Acolher a Palavra é uma forma de acreditar, por isso Santo
Agostinho ensina que os crentes “fortificam-se acreditando” (PF, 7).
O Papa Bento XVI quando abriu o Ano da Fé insistiu que ele fosse
celebrado de forma digna e fecunda, intensificando a reflexão sobre a fé para
ajudar a todos os crentes a tornarem mais
conscientes e revigorarem sua adesão
ao Evangelho (PF, 8). Acolhendo-o
e acreditando com o coração, professando-o e proclamando-o com a boca (Rm 10, 10). Exemplo de Lídia: “O Senhor
abriu-lhe o coração para aderir ao que Paulo dizia” (At 16, 14)
Considerações
Finais
1.
O Ano da Fé é um forte apelo a repensar a
fé e qualificar a fé.
2.
Na obediência da
fé, como Maria, precisamos acolher o anúncio e colocar-nos a serviço uns dos
outros, como Maria se colocou a serviço de Isabel.
3.
O Serviço com amor
e dedicação nos identifica e configura a Cristo, o servidor da humanidade e
qualifica nossa fé. Sabemos que a fé sem o serviço é estéril. Diz o Papa Bento:
“a fé sem a caridade não dá fruto e a caridade sem a fé seria um sentimento à
mercê da dúvida” (PF, 14). Direi que a fé se explicita no serviço e o serviço é
a caridade consumada. Que Deus nos faça seus verdadeiros servidores e servidoras. Amém!